O ensino de espanhol nas escolas públicas brasileiras tornou-se um campo de disputa entre embaixadas estrangeiras, entidades de professores e parlamentares. A controvérsia ganhou força após a aprovação do Novo Ensino Médio pela Câmara dos Deputados, que retirou a obrigatoriedade do ensino do idioma.
O texto aprovado, que aguarda sanção presidencial, foi elaborado pelo deputado federal Mendonça Filho (União-PE). A nova versão do projeto, que substitui a aprovada pelo Senado, mantém apenas o inglês como língua estrangeira obrigatória. A decisão gerou reações de diversas embaixadas, especialmente de países hispano-falantes, que defendem a importância do espanhol para a integração regional.
De um lado, países da América do Sul argumentam que o ensino do espanhol é crucial para fortalecer laços culturais e econômicos. Do outro, embaixadas de países europeus, como França, Alemanha e Itália, defendem a flexibilidade para que escolas possam escolher outras línguas, conforme suas necessidades e contextos locais.
Mendonça Filho justificou a decisão afirmando que a inclusão do espanhol poderia dificultar o aprendizado do português, que já enfrenta desafios significativos. Ele também mencionou a presença de comunidades de ascendência europeia no Brasil, que poderiam preferir o ensino de línguas de seus países de origem.
A obrigatoriedade do espanhol no ensino médio foi estabelecida em 2005, mas revogada em 2017 durante o governo de Michel Temer. A versão do projeto aprovada pelo Senado em 2023 previa a reincorporação do espanhol, mas essa cláusula foi removida pela Câmara. A senadora Dorinha Seabra (União-TO) criticou a decisão, destacando a importância do espanhol para os estudantes brasileiros, especialmente no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostram que 60% dos candidatos do Enem escolhem espanhol como língua estrangeira. Em resposta à decisão da Câmara, um novo projeto de lei, de autoria do deputado Felipe Carreras (PSB-PE), busca reincorporar o espanhol como disciplina obrigatória.
A disputa pelo ensino de línguas estrangeiras no Brasil também envolveu pressões diplomáticas. Embaixadas de países europeus e latino-americanos realizaram reuniões com o Ministério da Educação (MEC) para discutir a questão. Representantes de embaixadas hispano-falantes argumentaram a favor do espanhol, enquanto europeus defenderam a flexibilidade curricular.
Entidades de professores de espanhol e associações de linguística emitiram uma nota pública criticando a decisão da Câmara. Eles destacaram o papel do Brasil na América Latina e os investimentos feitos desde 2005 na formação de professores e na compra de materiais didáticos. A professora Mônica Nariño, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), afirmou que a decisão desestimula a formação de novos professores de espanhol.
O movimento de professores planeja buscar articulações estaduais para tornar o ensino do espanhol obrigatório por meio de legislações locais. Proposições nesse sentido já existem em estados como Pernambuco, Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo.
O Ministério da Educação (MEC) afirmou que estados, municípios e o Distrito Federal têm autonomia para organizar seus sistemas de ensino e podem estabelecer a obrigatoriedade de outras línguas estrangeiras além do inglês. A pasta, no entanto, não comentou sobre as pressões diplomáticas nem divulgou dados sobre a oferta de línguas estrangeiras na rede pública.
Essa batalha de interesses reflete a complexidade de se definir políticas educacionais em um país com tantas influências culturais e necessidades regionais distintas. A decisão final sobre a obrigatoriedade do espanhol no currículo escolar brasileiro ainda está em aberto, aguardando a sanção presidencial e possíveis novas articulações legislativas.